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O reajuste anual de medicamentos de 2020 está cercado de uma série de entraves.
Afinal, neste ano, diante da pandemia pela Covid-19, este reajuste, que sempre passa a vigorar em 1º de abril, foi congelado, e autorizado a partir de 1º de junho.
Até o momento, o reajuste máximo permitido para 2020 foi aplicado em três faixas: de 5,21%, 4,22% e 3,23%, a depender do tipo de medicamento. Entretanto, a matéria ainda segue em análise e deve passar pela Câmara e Senado.
Nesse sentido, nesta reportagem, os leitores poderão esclarecer todas as dúvidas recorrentes que ainda permeiam sobre o tema; conhecer os cálculos-base para o reajuste de medicamentos 2020; a atual situação desse processo; o que as farmácias podem perder caso decidam não repassar o reajuste ao consumidor; os prejuízos para a indústria; e a importância em deter a lista de preços atualizada.
Leia esta matéria e fique por dentro das atualizações sobre o tema!
O que é o reajuste de medicamentos?
A Lei nº 10.742, de 06 de outubro de 2003, prevê o reajuste anual dos preços de medicamentos baseado no modelo de regulação por teto de preços (price cap).
Esse modelo, detalhado na Resolução CMED nº 01/2015, retificada pela Resolução CMED nº 05/2015, prevê a aplicação de um índice geral de preços, um fator produtividade (X) e dois fatores de ajustes de preços, um entre setores (Y) e o outro intrassetorial (Z).
O índice geral de preços utilizado é o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O período de observação para efeitos de cálculo do reajuste considera o IPCA acumulado nos doze meses anteriores à data do cálculo, no caso, março de cada ano.
A segunda variável do modelo é um fator de produtividade que permite repassar ao consumidor os ganhos estimados de produtividade do setor farmacêutico (fator X).
A terceira variável, o fator Y, tem como objetivo ajustar os preços relativos entre o setor farmacêutico e os demais setores da economia, para minimizar o impacto dos custos não-administráveis nas empresas do setor farmacêutico.
Por fim, o fator de ajuste de preços relativos intrassetoriais (fator Z) é o mecanismo inserido no cálculo do ajuste de preços com o intuito de diminuir o poder de mercado das empresas que produzem medicamentos de classes terapêuticas com baixa contestabilidade, incentivando a competição no setor.
Qual o órgão responsável pelo reajuste de medicamentos?
A Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) é o órgão interministerial responsável pela regulação econômica do mercado de medicamentos no Brasil e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) exerce o papel de Secretaria-Executiva da Câmara.
A CMED estabelece limites para preços de medicamentos, adota regras que estimulam a concorrência no setor, monitora a comercialização e, por fim, aplica penalidades quando suas regras são descumpridas.
Ademais, o órgão é igualmente responsável não apenas pela fixação, como também pelo monitoramento da aplicação do desconto mínimo obrigatório para compras públicas.
Como o Brasil regula o mercado de medicamentos?
Foram adotadas algumas das melhores práticas internacionais – referenciamento externo e interno de preços e Avaliações de Tecnologias em Saúde (ATS) – para promover o equilíbrio no mercado farmacêutico.
Ademais, segundo a Anvisa, a metodologia de precificação adotada pela CMED busca garantir que os preços máximos de entrada de medicamentos novos no País não sejam superiores ao menor preço encontrado numa cesta de nove países.
Também estipula-se que o reajuste de medicamentos não acarrete custos de tratamento mais altos, em comparação às alternativas terapêuticas já existentes para a mesma enfermidade. Isso caso não ser que seja comprovada sua superioridade em comparação a elas.
Esse último aspecto é verificado com a utilização de Avaliações de Tecnologias em Saúde (ATS), que consistem na comparação entre duas tecnologias – medicamentos – com a mesma indicação, levando em conta critérios como eficácia, efetividade, segurança e custo-efetividade.
Quais são as variantes consideradas para o reajuste de medicamentos 2020?
Para chegar ao índice, a CMED observa alguns fatores. Entre eles:
- A inflação dos últimos 12 meses (IPCA);
- A produtividade das indústrias de medicamentos (X);
- Os custos não captados pela inflação, como o câmbio e tarifa de energia elétrica (Y);
- E a concorrência de mercado (Z), conforme determina o cálculo aderido desde 2015.
Qual a fórmula para o cálculo do reajuste de preços?
Desde 2015, o Ministério da Saúde, a Anvisa e os demais Ministérios que compõem a CMED adotam critérios para melhor adequar o índice à realidade do mercado farmacêutico, favorecendo a concorrência.
A fórmula de cálculo, aprovada por consulta pública, garante:
- Maior transparência, por detalhar toda metodologia de cálculo do ajuste;
- Segurança, por utilizar apenas fontes oficiais e públicas;
- Previsibilidade, por determinar datas de divulgação dos fatores;
- E maior racionalidade, por estimar com precisão a concorrência de mercado e por usar fontes que refletem melhor todo o mercado brasileiro de medicamentos.
O cálculo é feito da seguinte forma:
VPP = IPCA – X + Y + Z, em que:
VPP é a variação percentual no preço;
IPCA é o índice de preços ao consumidor, calculado pelo IBGE;
X é o fator de produtividade repassado ao consumidor, calculado pela SEAE/ME;
Y é o fator de ajuste de preços entre setores, calculado pela SEAE/ME; e
Z é o fator de ajuste de preços intrassetor, estipulado pela Secretaria Executiva da CMED, e calculado em função do fator X.
A adoção da regulação de preços do tipo price cap, ou preço-teto, na regulação do mercado de medicamentos tem previsão na Lei nº 10.742/2003, embora não tenha definido a metodologia para o seu cálculo.
Dessa forma, a CMED tem liberdade para estabelecer o método de cálculo dos fatores. Isso desde que se dê a devida publicidade e transparência, conforme previsto no art. 4º, §6º da Lei nº 10.742/2003.
Qual foi o reajuste aplicado aos medicamentos em 2020?
A CMED publicou, no dia 1o de junho, a Resolução nº 1, que autoriza as empresas produtoras de medicamentos a reajustarem o valor dos produtos após o fim da vigência da Medida Provisória nº 933, de 31 de março de 2020, que suspendeu o reajuste por 60 dias.
Em 2020, o reajuste máximo dos preços dos medicamentos será:
- 5,21% (Nível 1);
- 4,22% (Nível 2);
- 3,23% (Nível 3).
Vale lembrar que, em primeiro lugar, o Nível 1 é categoria com maior participação de genéricos (genéricos têm faturamento igual ou superior a 20%) e, portanto, um teto mais alto de reajuste.
Em segundo lugar, o Nível 2, com partição média de genéricos (representam entre 15% e 20% do faturamento), tem um teto de reajuste médio.
Por fim, o Nível 3 é a categoria com menor participação de genéricos (inferior a 15% do faturamento) e, portanto, com menor concorrência de mercado e mais baixo índice de reajuste.
Quais as normas em vigor que tratam de medicamentos liberados dos critérios de estabelecimento ou ajuste de preços?
Encontram-se atualmente em vigor as seguintes normas:
Resolução CMED nº 2, de 26 de março de 2019, que dispõe sobre os procedimentos para o monitoramento e liberação dos critérios de estabelecimento ou ajuste de preços de medicamentos isentos de prescrição médica, medicamentos fitoterápicos, produtos tradicionais fitoterápicos e anestésicos locais injetáveis de uso odontológico;
Comunicado CMED nº 4, de 26 de março de 2019, que divulga os grupos de medicamentos objeto da Resolução CMED nº 02, de 26 de março de 2019; e
Comunicado CMED nº 5, de 25 de abril de 2019, que divulga as classes terapêuticas cujos medicamentos isentos de prescrição foram liberados.
Por que é importante regular o mercado de medicamentos?
O mercado de medicamentos, nacional e internacionalmente, é caracterizado pela presença de bens credenciais, baixa elasticidade da demanda, barreiras à entrada de novos concorrentes e, ainda, forte assimetria de informações, entre outras falhas de mercado.
Assim, de acordo com a Anvisa, muitos países adotam modelos regulatórios que promovem a concorrência, estimulam o acesso aos medicamentos e à inovação farmacêutica.
As empresas distribuidoras e varejistas deverão reportar suas vendas para a CMED?
Não. As informações de comercialização dos medicamentos liberados só devem ser reportadas pelas empresas detentoras de registro dos medicamentos, ou seja, empresas produtoras ou importadoras.
Qual será o preço fabricante e o preço máximo ao consumidor em 2020?*
O Preço Máximo ao Consumidor (PMC) será calculado por meio da divisão do Preço Fabricante (PF) pelos fatores constantes apresentados na tabela abaixo:
Igualmente, leva-se em consideração as cargas tributárias do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) nos estados de destino.
A incidência da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS), ao Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) também serão consideradas.
Nos estados de destino, onde a carga tributária do ICMS for diferente das da tabela acima, o PMC será calculado de acordo com os fatores de conversão divulgados em Comunicado da Secretaria-Executiva da CMED.
*Fonte: Portal Ascoferj
O reajuste de medicamentos aplicado em 2020 ainda pode ser alterado?
Pela resolução da CMED publicada no Diário Oficial, o reajuste máximo permitido para este ano será aplicado em três faixas, de 5,21%, 4,22% e 3,23%. A porcentagem depende do tipo de medicamento.
Por que o reajuste de medicamentos continua?
Segundo explicou ao Guia da Farmácia o diretor de Mercado e Assuntos Jurídicos do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Bruno Abreu, a MP 933 teve a sua validade por 60 dias e o trâmite dela pode ser renovado.
“O que o presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre fez foi renovar o trâmite da MP no Congresso Nacional por mais 60 dias, mas não a suspensão. Não se pode mudar o texto. Então, dessa forma, a determinação MP 933 acabou no dia 31 de maio”, esclarece.
Assim, na sequência, veio o Projeto de Lei (PL) 1.542, de 2020, do senador Eduardo Braga (MDB-AM), que segue para a Câmara dos Deputados e pede uma nova suspensão, adiando o reajuste para 30 de julho próximo.
“O Senado aprovou o PL, mas ele parou aí, por enquanto. Ainda não virou lei e, portanto, não gera direito. Agora a matéria vai para a Câmara para ser discutida e depois, se mudarem o texto, volta para o Senado, para depois ir para a sanção do Presidente da República”, diz Abreu
Caso o reajuste dos medicamentos seja suspenso em 2020, quais são os prejuízos para a indústria?
O Sindusfarma acredita que o reajuste do preço dos medicamentos deve prevalecer conforme determinação da CMED.
“Estamos preocupados com a saúde financeira da indústria farmacêutica diante do recente e expressivo aumento de custos. Para as empresas mais pressionadas por essa circunstância, o reajuste, ainda que baixo, vai ajudar a equilibrar as contas e viabilizar a produção”, pontuou o presidente executivo da entidade, Nelson Mussolini.
Segundo ele, o reajuste anual de preço dos medicamentos é absolutamente necessário para viabilizar a operação da indústria farmacêutica no País, assim, garantindo o fornecimento normal de medicamentos para a população.
“Após 14 meses de preços inalterados, a indústria farmacêutica precisa desse reajuste anual – de apenas 4,08%, na média – para repor parte do aumento de custos acumulados no ano passado e, mais recentemente, em razão da pandemia de coronavírus, com as expressivas altas do dólar e dos custos de logística, matérias-primas e insumos. Ressalte-se, ainda, que os valores sobre os quais o reajuste incide são relativamente baixos. Por exemplo, no Brasil, uma caixa de medicamento genérico custa pouco mais de R$ 6,00, em média, e um medicamento similar ou novo, menos de R$ 20,00, segundo levantamento CMED, de 2018”, destacou a entidade.
De que forma a logística de medicamentos foi prejudicada pela pandemia e implica na necessidade de reajuste em 2020?
“Normalmente, os insumos chegam ao Brasil por navio. Hoje, durante a pandemia, está chegando de forma aérea. Com isso, o valor do frete, também pago em dólar, aumentou muito. São muitos custos envolvidos nessa operação, o que torna o reajuste uma ação necessária”, destacou o presidente da Associação do Comércio Farmacêutico do Estado do Rio de Janeiro (Ascoferj), Luis Carlos Marins.
Dessa forma, de acordo com ele, uma nova suspensão traria prejuízos para as farmácias e para a indústria.
“Temo que, se o aumento do valor do medicamento for novamente suspenso, isso pode vir a gerar falta de moléculas na indústria brasileira e, consequentemente, falta de produtos no mercado. Como comprar um produto e vendê-lo abaixo do custo tido para produzi-lo? O custo da compra da matéria-prima, importação e industrialização é alto e; caso o reajuste seja novamente suspenso, o fabricante ficaria no negativo, o que seria muito pior”, avalia o executivo acrescentando que, no momento atual, em meio a uma pandemia, não seria prudente realizar essa suspensão.
“Muitas pessoas tomam medicamentos de uso contínuo que não podem ser interrompidos. É melhor pagar um pouco a mais do que parar os tratamentos”, argumentou Marins.
Quanto a farmácia pode perder se não aplicar o ajuste?
O índice de reajuste de medicamentos em 2020 foi de 5,21%, 4,22% e 3,23%. Logo, a média é de 4,22%.
Considerando uma farmácia com faturamento de R$ 300 mil mensais vendendo só medicamentos, não aplicar o reajuste significa perder o equivalente a R$ 12.660,00 ao mês (memória de cálculo – R$ 300 mil x 4,22% = R$ 12.660,00).
Ou considerando 26 dias trabalhados por mês (incluindo os sábados), o prejuízo diário pode ser de R$ 486,92 (memória de cálculo – R$ 12.660,00 / 26 dias = R$ 486,92).
Portanto, para este cálculo, gestor da farmácia precisa considerar a sua média de faturamento mensal e multiplicar o valor pela média do reajuste.
Para verificar a perda diária, o caminho é dividir o resultado do prejuízo mensal com essa medida pelo número de dias trabalhados por mês.
Qual a origem dos preços publicados nas mídias especializadas do setor?
Os preços publicados em mídias especializadas do setor farmacêutico são informados pelas próprias empresas detentoras dos medicamentos comercializados.
Portanto, independentemente do regime de preço, liberado ou regulado, as próprias empresas são as responsáveis por enviar os preços dos seus medicamentos para serem divulgados em mídias especializadas.
Conclusão
O reajuste de preços de medicamentos é um processo anual, que acontece no dia 1o de abril. Contudo, diante da pandemia pelo Covid-19, em 2020, esse reajuste foi congelado por 60 dias, sendo novamente autorizado no dia 1o de junho.
Embora o tema ainda esteja passando por nova avaliação pela Câmara e pelo Senado, o que vale até agora é o reajuste estabelecido pela CMED de de 5,21%, 4,22% e 3,23%, a depender do tipo de medicamento.
Portanto, é fundamental estar atento ao tema, já que ele pode implicar em diversas mudanças dentro da farmácia.